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A Vitória da Esperança.

''Todos nós temos de nos empenhar em ser vitoriosos em alguma coisa, nem que seja em fazer a comida para a família.'' - Esperança Vitória, Artesã & CEO da Victoria Handmade.


Artesanato Português
Molho de Junco (matéria-prima) & Esperança Vitória, Revista ACTIVA 2018

''O nome Victoria Handmade remete-nos para as cestas que se tornaram objeto de desejo, com que várias bloggers desfilam nas redes sociais.


Uma imagem que vai buscar consistência à tradição portuguesa da cestaria de junco e ao trabalho árduo que nunca meteu medo à líder da 'revolução', Esperança Vitória.


Junco. Junco. Junco. Repito vezes sem conta, como uma criança que está a aprender a lição. ''Ainda no outro dia saiu uma notícia em que escreviam cestas de vime. Não são cestas de vime. São de junco.'' Não vá eu esquecer, Esperança Vitória repete-o várias vezes ao longo da tarde que afirma ter sido 'inesquecível'. Afinal, apesar das suas cestas (de junco!) andarem nas bocas do mundo da moda, saltos alto só aqueles que tem dado nos negócios, desde que lançou a Victoria Handmade em 2014. Esperança Vitória transformou a arte da cestaria que aprendeu com os pais num negócio sustentável que vinga dentro e fora de Portugal, com vendas repartidas entre online na loja www.victoria-handmade.com e no showroom no centro de Portugal.


Em cima da bancada, os exemplos da Vogue Britânica, onde a marca fez notícia várias vezes durante o verão, são prova do reconhecimento internacional de que goza não só na Europa como em países como os Estados Unidos, Austrália e Emirados Árabes Unidos, muito graças ao Instagram.


Estamos em Corredoura, Porto de Mós, no atelier que representa a mais difícil decisão de negócios que Esperança já tomou: ''Abrir a porta ao público, pôr cá para fora um projeto que começou ainda dentro da casa da minha avó. Um risco, pela desvalorização do ofício e pelo caminho que queríamos percorrer.''




Ossos Do Ofício:

- O maior desafio é continuar a ter mãos para trabalhar, aguentar fisicamente.
- Sou perfeccionista, sou exigente, primeiro comigo, depois com os outros.
- Estou mais tolerante com a idade, percebi que a partir do momento em que as pessoas dão o seu máximo não posso exigir mais. Não podemos querer que os outros façam exatamente aquilo que queremos, se não éramos todos iguais.
- Consigo delegar, mas tenho de supervisionar. Há certas coisas em que não nos podemos demitir das responsabilidades.


marcas portuguesas
Nina, Herói, Esperança Vitória, Mala Trendy - Revista ACTIVA 2018

Operação De Resgate.


Sou interrompida pela pata do Herói, que me lembra que a pausa da festa já vai longa. O Serra da Estrela resgatado da rua há poucos meses, é grande mas quem manda é Nina, uma Pincher Alemã, também salva do abandono, atenta mas menos dada a confianças. Esperança Vitória fala com entusiasmo dos seus fiéis companheiros, também parceiros de negócio, já que é ao atelier / showroom que chamam casa. Victoria Handmade é também a história de um resgate, de um ofício em vias de extinção, à precariedade e insustentabilidade. É Esperança que agora vai tecendo um novo capítulo de uma velha tradição familiar, alimentado em parte por um rejuvenescido apreço nacional pelo artesanato e pela portugalidade.


Esperança Vitória é natural de Castanheira, aldeia no concelho de Alcobaça com grande tradição na cestaria - de onde é também, a título de curiosidade, outro Toino, que não seu pai, e este Toino Abel, também conhecido no negócio, de uma família mais ligada ao comércio do que ao fabrico das cestas. ''Cada casa cada tear. Não havia família que não soubesse fazer pelo menos um dos processos envolvidos na cestaria.''


Esperança não se lembra de ter propriamente aprendido o ofício, ''as minhas primeiras memórias são da minha mãe a tecer, houve um dia em que simplesmente subimos para cima de um tijolo para chegar ao tear e começámos a trabalhar'', mas recorda-se da aversão que lhe sentia.


''Para começar não era remunerado, e depois era um trabalho árduo. Tivemos uma infância de trabalho mas hoje olhamos para trás e conseguimos ver as mais-valias, temos competências que não teriam sido adquiridas de outra maneira.''

cestas malas de junco portuguesas
Esperança Vitória, Artesã & CEO - Victoria Handmade


A Insustentável Leveza Do Junco.


Perante uma arte incapaz de lhes garantir o sustento, as quatro irmãs acabariam por abandonar o ofício, mas no caso de Esperança, a boa filha a casa tornou. Muito mais tarde. Quando tomou a decisão de que estava na hora de ...


''tirar o projeto da gaveta e revolucionar a cestaria de junco.''


Na altura trabalhava com idosos na Casa da Misericórdia de Porto de Mós. E a idade aqui também pesou.


''Estava com 38 anos, ou me conformava ou dava o salto para um projeto meu, que me fizesse sentir mais realizada.''


Regressou ao passado para dar à cestaria um futuro, com todas as dificuldades que ressoavam. A maior?


''A desvalorização desta arte - ainda que tenha vindo a melhorar. Ainda hoje há pessoas de uma faixa etária bastante avançada a trabalhar nisto, como complemento da reforma, porque as pessoas jovens não conseguem viver da cestaria.''


Não é portanto de estranhar que Esperança não tenha dúvidas em relação à sua maior vitória:


''Conseguir que quem trabalha comigo tenha toda a dignidade em termos de mercado de trabalho. Até agora não era possível ter um emprego dentro desta área.''


E é da mesma matéria que também é feito o seu maior fracasso:


''Sentir que não podemos resolver todos os problemas deste mundo e conseguir que todas as pessoas tenham essa dignidade.''



Moda sustentável
Produção ACTIVA, Entrevistada, Jornalista, Estilista, Maquilhadora & Fotografo

Alta Versatilidade.


Esperança Vitória é mais reservada quando se trata de falar de si, chega mesmo a acusar-me, bem humorada, de estar a fazer de Daniel Oliveira quando o assunto é mais pessoal. O que dizem os seus olhos não fico a saber exatamente - vejo alguma tristeza com a morte da mãe em 2013, e a crescente debilidade do pai. Mas as suas mãos (e discurso!) não deixam dúvida, dizem claramente que é uma mulher de trabalho.


''Não me mete medo'', diz. Não consigo que me diga a sua área favorita, mas é neste silêncio que ouço o seu segredo para o sucesso:


''Empenho e dedicação, termos o mesmo à-vontade em qualquer área, quer seja a tecer, a varrer ou em qualquer outra tarefa.''


E não é conversa, a sua versatilidade ecoa por todos os recantos do negócio - do fabrico à gestão -, mesmo em tarefas até agora exclusivamente masculinas. Esperança Vitória acredita ser a única mulher em Portugal a colocar asas nas cestas, essas, sim, de vime, uma matéria-prima mais difícil de manusear do que o junco. Até há seis anos era o seu pai que o fazia.


''Quando o vi ficar mais debilitado, decidi aprender para não ficar dependente de ninguém de fora. Entristeceu-me muito foi ver o meu pai, que colocava as asas de olhos fechados, a não conseguir fazê-lo bem, ele que também era perfeccionista.''



Seiras Portuguesas pelo mundo
Revista ACTIVA, Edição 2018

Sucesso, Disseram Elas.


Era assim até há bem pouco tempo: eles dedicavam-se ao junco e à colocação das asas, elas cosiam e teciam. Mas aqui tudo está sob o domínio feminino. Não fosse Esperança a terceira de quatro raparigas.


Na empresa, tem ao seu lado mais duas mulheres fortes (três, se contarmos com Nina), a irmã mais velha, Carla, e a filha, Daniela, formada em design gráfico e responsável pela imagem e comunicação da Victoria Handmade.


É a jovem de 20 anos que encontramos quando voltamos ao atelier depois da última fotografia no exterior. Logo percebemos o motivo da indignação de Herói e Nina. Daniela atende uma família de Lisboa, mãe e filha estão visivelmente felizes. É esta felicidade um dos combustíveis que move a nossa entrevistada. Complete a frase ''tenho esperança de…'', tinha eu pedido minutos antes à empreendedora, à laia de Daniel Oliveira.


''... Continuar a trabalhar com este empenho e dedicação e a levar felicidade à vida das pessoas que recebem as nossas peças.''


Vitória, Vitória, acabou-se a história. Ou parte dela, que a arte da Esperança está longe de morrer.''


Quando me sinto desmotivada e com vontade de desistir, releio a entrevista de há 3 anos da maravilhosa jornalista Cíntia Sakellarides, fotografada pelo espetacular Ricardo Santos, vestida pelo bom gosto da Rita Vilhena e embelezada pela Clementina Costa.


Revivo as palavras que ainda hoje me inspiram a continuar e que reparti-lho consigo na esperança de também a/o inspirar a perseguir os seus sonhos, como eu fiz, apesar de haver mais contras do que prós.


Acredite, não há sentimento maior que aquele de objetivo cumprido, quando todos disseram não ser possível, e eu ter lá chegado ainda assim.


Gratidão. A si, sim. Por me ter ajudado a tornar isto possível.

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